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Professora é alvo de investigação da PF por causa de outdoor com criticas ao governo Bolsonaro; UFRPE diz que censura é ‘inadmissível’

Uma professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) é alvo de investigação da Polícia Federal (PF) por causa de um outdoor com críticas ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Ericka Suruagy informou, nesta quarta (10), que prestou depoimento pela internet. Em nota, a instituição se manifestou sobre o caso e disse que censura é “inconstitucional e inadmissível”.

A investigação foi aberta no dia 29 de janeiro deste ano. Segundo o relatório do inquérito policial, o objetivo é apurar crimes contra a honra dispostos no Código Penal, nos artigos 140 e 141.

De acordo com a UFRPE, a docente, que atua no Departamento de Educação, é alvo de um inquérito aberto “a pedido do presidente da República”.

A apuração foi iniciada por causa da colocação, em 2020, de outdoors com os dizeres “o senhor da morte chefiando o país. No Brasil, mais de 120 mil mortes por Covid-19 #ForaBolsonaro”.

Atualmente, o número de mortos na pandemia ultrapassa 270 mil. Somente nesta quarta-feira (10), houve 2.349 óbitos confirmados em 24 horas. O número, um recorde, é o maior registrado desde início da pandemia.

Na época, Erika Suruagy era presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Rural de Pernambuco (Aduferpe). Atualmente, ela ocupa o cargo de vice-presidente.

G1 tentou contato com a Superintendência da Polícia Federal no estado, para obter detalhes do inquérito, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.

O caso se assemelha ao de dois professores da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul.

Com o ex-reitor Pedro Curi Hallal, o coordenador das pesquisas de prevalência do coronavírus no Brasil, e o pró-reitor de Extensão da universidade, Eraldo dos Santos Pinheiro, assinaram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), em que se comprometem a não realizarem manifestações “desrespeitosa e de desapreço” em relação a Bolsonaro, por dois anos.

Perplexidade

O depoimento foi prestado, segundo Érika Suruagy, por meio de videoconferência, à delegada Aline Carvalho Miranda, da Superintendência da PF no Distrito Federal. A abertura do inquérito foi feita após um requerimento do presidente ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

“Essa foi uma campanha coletiva, de vários sindicatos, mas a delegada chegou à Aduferpe por meio da empresa que fez o outdoor, já que somos os maiores contratantes. Ficamos perplexos com a abertura do inquérito, porque o outdoor não fala nada de mais. Não era para ofender o presidente como pessoa, mas questionar uma política sanitária”, afirmou a professora.

Érika Suruagy, é doutora em educação e trabalha há 17 anos como professora do ensino superior, sendo 11 deles na UFRPE. A docente considera que a abertura do inquérito é uma forma de tentar censurar servidores públicos.

“Achamos estranho que, diante de tantas demandas, tantos bandidos que existem para que a PF investigue, ela tenha que, agora, estar indo atrás de quem fez um outdoor. A gente percebe uma clara tentativa de usar a força policial para intimidar, silenciar, como, inclusive, tem sido feito com professores em outros locais”, disse a docente.

Por meio de nota, a Administração Superior da UFRPE expressou solidariedade à professora e disse que “reafirma-se o direito legítimo a manifestações públicas, sejam de origem do movimento sindical ou de qualquer outra, ressaltando-se o caráter inconstitucional e inadmissível da censura”.

“Eu represento uma categoria com mais de mil pessoas e a campanha foi aprovada em assembleia. Ela é uma denúncia de como o governo está gerindo a pandemia, tendo em vista que a Constituição garante liberdade de expressão. Não tínhamos intenção de ofender pessoalmente o presidente, mas ele é o maior responsável, junto com o ministro da Saúde, por essa gestão”, declarou Suruagy.

A Aduferpe, também por meio de nota, afirmou que recebeu a notícia da convocação de Erika Suruagy, para depor na Polícia Federal.

A associação afirmou que “trata-se de um brutal ataque à mais elementar liberdade de expressão garantida constitucionalmente” e que a ação “é uma tentativa de calar opiniões e intimidar o legítimo e livre exercício da atividade associativa”.

Sobre os outdoors, a Aduferpe afirmou que a crítica “pode facilmente ser estendida a outras esferas de governo” e “revelou-se desgraçadamente justa”, já que “à época eram 120 mil mortes a lamentar e hoje já são quase 300 mil”.

A Assessoria Jurídica da associação disse que está “segura de que não há nenhuma base legal para que um processo seja instaurado” e que “o fato de a professora Erika Suruagy ter sido convocada e de ter que prestar depoimento na Polícia Federal é de inteira responsabilidade de Jair Bolsonaro”.

Na visão da associação, o presidente “está claramente tentando intimidar sindicalistas, cientistas, professores, servidores públicos, artistas, intelectuais e cidadãos que discordam da política do governo”.

Também por meio de nota, divulgada nesta quarta (10), o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes) repudiou a investigação.

Segundo a entidade, a ação é “mais uma atitude que sinaliza o recrudescimento de medidas autoritárias, voltadas ao estrangulamento das liberdades civis e democráticas no país, bem como ao constrangimento e criminalização dos lutadores e lutadoras sociais”.

Ainda de acordo com a Andes, a investigação é feita de “modo absurdo e afrontoso às liberdades políticas inscritas na Constituição de 1988.

O sindicato disse, ainda, que “a Polícia Federal dá continuidade à infundada queixa e, buscando afetar individualmente a professora e militante, estica questão que poderia ser ceifada de início, tendo em conta não só o próprio conteúdo das liberdades de manifestação e oposição política ao governo, como também ante a cruel verdade que expressa a mensagem do outdoor, que se refere ao descalabro na gestão pandêmica”.

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