A Assembleia Legislativa do Estado do Acre (Aleac) sediou, na manhã desta segunda-feira (26), uma audiência pública para debater a situação dos servidores da Associação dos Municípios do Acre (AMAC), após a demissão em massa de trabalhadores com mais de 20 anos de serviço. A reunião, proposta pelo deputado Tanízio Sá (MDB), reuniu prefeitos, representantes do Ministério Público, advogados, servidores e técnicos da AMAC para discutir o futuro da entidade e os impactos sociais e legais das recentes decisões administrativas.
Durante a audiência, o deputado Tanízio classificou como “grave” a forma como os desligamentos foram conduzidos. “Pegaram uma decisão para usar em torno de todo mundo. Se não tem decisão trabalhista, não poderia haver demissão. A maioria dos prefeitos é favorável à permanência desses trabalhadores. É hora da AMAC rever seus atos e voltar à normalidade”, declarou.
Ministério Público reafirma irregularidades na natureza jurídica da AMAC
O promotor de Justiça Carlos Maia, representante do Ministério Público Estadual, foi enfático ao afirmar que a AMAC não é um consórcio público, como vinha sendo alegado por alguns gestores. “As provas estão aqui. Não houve aprovação de leis específicas nas câmaras municipais para transformar a AMAC em consórcio. Portanto, ela continua sendo uma associação privada, sem obrigação de realizar concurso público para contratar pessoal. Usar esse argumento para justificar demissões é uma distorção jurídica grave”, afirmou.
Já a procuradora do Trabalho, Marielle Viana, agradeceu o convite para participar da audiência pública e destacou a importância da união institucional em defesa dos direitos dos trabalhadores acreanos. Segundo ela, o caso chegou ao conhecimento do Ministério Público do Trabalho por meio de uma provocação do próprio Dr. Leonardo, que informou a existência de um pedido de mediação tramitando em Porto Velho, sede do núcleo responsável pelo Acre e Rondônia. Ela ressaltou que, embora ainda não houvesse procedimento formal em Rio Branco, o Ministério Público do Trabalho se fez presente na audiência por reconhecer a gravidade da situação.
Ao concluir, reforçou o compromisso do MPT com os trabalhadores acreanos e afirmou que, mesmo diante de disputas políticas, os vínculos laborais precisam ser respeitados e protegidos. “Nosso compromisso é com o trabalhador, seja qual for o vínculo. Não podemos aceitar que, por vontade política, se desamparem vidas e histórias construídas no serviço público”, afirmou.
Procurador questiona legalidade de demissões e defende vínculo empregatício de servidores com a AMAC
O procurador adjunto, Leonardo Cesário, afirmou durante a audiência que não há qualquer nulidade nas contratações realizadas pela Associação dos Municípios do Acre (AMAC), rebatendo as alegações que tratam a entidade como consórcio público. Segundo ele, não há registro formal de que a AMAC tenha passado pelo processo legal necessário para se transformar em consórcio público, e que, portanto, continua sendo uma associação privada, regida por regras próprias e sem necessidade de concurso público para contratação. “Se fosse consórcio público, as gestões anteriores estariam em maus lençóis, pois teriam descumprido normas legais por décadas”, argumentou. Leonardo destacou ainda que os funcionários ameaçados de demissão têm, em sua maioria, mais de 20 anos de trabalho na instituição e idade avançada, o que dificulta uma recolocação no mercado.
Ele revelou que ingressou com três ações judiciais na Justiça do Trabalho buscando preservar o vínculo desses trabalhadores, tendo obtido liminar favorável em duas delas. Entretanto, a AMAC recorreu para derrubar essas decisões, conseguindo êxito em uma. No caso da liminar mantida, a desembargadora relatora entendeu que há dúvidas razoáveis que justificam uma análise mais aprofundada do caso. “A nossa intenção é preservar esses vínculos. São pais e mães de família que merecem respeito e dignidade. Vamos lutar até o fim pela validade dos contratos”, concluiu.
Advogado denuncia ambiente de terror psicológico
O advogado Paulo Cesário Rosa, representante de um grupo de servidores demitidos, apresentou relatos impactantes sobre o ambiente hostil instalado na instituição. “Instalaram câmeras para todos os lados, criando um ambiente de vigilância constante. Uma funcionária me disse que não consegue mais pisar na AMAC, que treme ao passar na frente do prédio. Isso é tortura psicológica. Se querem demitir, que o façam com base legal e com pagamento de todos os direitos. Mas forçar demissão por desgaste é covardia”, denunciou.
Prefeitos se posicionam contra demissões e pedem diálogo
O prefeito de Brasiléia, Carlinhos do Pelado, relatou que a questão já havia sido debatida entre os gestores e manifestou preocupação com o destino dos trabalhadores. “Desde o início, me preocupei com essa situação. São pessoas com mais de 20 anos de trabalho, pais e mães de família. Do jeito que está sendo feito, não conta com o meu apoio”, afirmou.
Na mesma linha, o prefeito Padeiro, do Bujari, disse que a entidade deveria resolver os conflitos com diálogo e respeito à legalidade. “A AMAC está aproveitando uma decisão para fazer uma limpa que não é justa. A maior parte dos prefeitos é contra isso. Precisamos de uma assembleia da AMAC para resolver esse impasse, porque temos projetos, recursos e precisamos funcionar”, alertou.
Técnicos relatam desvalorização e sobrecarga
Em um dos momentos mais emocionantes da audiência, Raline Alves, servidora técnica da AMAC desde 2012, fez um apelo pela valorização dos trabalhadores. “Não estamos pedindo nada além dos nossos direitos. Sempre trabalhamos com compromisso, sem olhar partido político. A cobrança aumentou, o número de municípios cresceu, mas a equipe técnica continua a mesma. Mesmo assim, damos conta. A AMAC precisa continuar sendo técnica”, disse, em lágrimas.
A servidora também afirmou que, apesar do clima de insegurança, os servidores continuam empenhados. “Se tiver R$ 10 milhões de um prefeito, podem ter certeza que vou cadastrar, vou empenhar, vou fazer o melhor. Porque sempre foi assim”.
Encaminhamentos
Ao final da audiência, ficou decidido que os prefeitos devem convocar, com urgência, uma assembleia geral da AMAC para discutir a situação jurídica da entidade, os atos administrativos e a reintegração ou regularização dos servidores. O Ministério Público do Trabalho se comprometeu a seguir acompanhando o caso, que também está em fase de mediação no núcleo sediado em Porto Velho (RO), responsável por processos envolvendo Acre e Rondônia.
O deputado Tanízio Sá afirmou que seguirá acompanhando o desdobramento da crise e que apresentará requerimentos para garantir transparência e respeito aos direitos dos trabalhadores. “A Assembleia não se furtará de sua responsabilidade institucional diante de uma situação que atinge dezenas de famílias acreanas”, finalizou.
Texto: Mircléia Magalhães/Agência Aleac
Fotos: Sérgio Vale