Em um mês inteiro de mobilizações intensas, a cidade de Cruzeiro do Sul viveu o Maio Laranja com emoção, coragem e um profundo senso de responsabilidade coletiva. A campanha nacional de enfrentamento ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes, que tem seu auge no dia 18 de maio, encontrou na cidade acreana um terreno fértil para plantar conscientização e colher denúncias, histórias, reflexões e esperanças.
O encerramento da campanha, ocorrido nesta semana, reuniu representantes da rede de proteção, alunos, professores, pais e autoridades, como o juiz Luiz Fernando Rosa, titular da Vara da Infância e Juventude, que tem se dedicado a fortalecer as ações de combate aos crimes sexuais contra crianças e adolescentes, especialmente nas regiões mais vulneráveis da cidade.

“O mês de maio é um mês muito caro para nós. É quando intensificamos nossos esforços para conscientizar e combater crimes que violam a dignidade sexual de crianças e adolescentes. Atuamos nas escolas da zona urbana e rural com palestras, blitzes educativas e panfletagens”, afirmou o juiz Luiz Fernando.
Além das ações informativas, o encerramento contou com uma palestra técnica sobre a diferenciação entre escuta qualificada e depoimento especial — dois procedimentos fundamentais na investigação de denúncias de abuso, que priorizam o acolhimento e a escuta protegida das vítimas.
Segundo o magistrado, as ações geraram resultados imediatos: “No final de muitas palestras, algumas crianças se aproximaram e relataram abusos sofridos em casa, muitas vezes por familiares ou pessoas conhecidas. Isso reforça a importância da conscientização desde cedo.”
A campanha não foi uma ação isolada. Ela mobilizou diversos órgãos como a Defensoria Pública, Ministério Público, Delegacia Especializada, Conselho Tutelar e instituições de ensino. Na linha de frente, o CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) teve papel central na coordenação das atividades e acolhimento das denúncias.

“Atingimos cerca de 5.150 pessoas, entre alunos e professores. Realizamos blitzes educativas, plantio simbólico com crianças do Educandário e concursos de desenho e redação. E, com isso, recebemos cinco denúncias diretamente nas escolas”, destacou Cíntia Sampaio, coordenadora do CREAS.
Cíntia pontua que o trabalho vai muito além da campanha de maio. “O CREAS atua o ano todo, oferecendo apoio psicossocial a vítimas de abuso sexual, violência doméstica, moradores de rua, idosos e adolescentes com dependência química. Essa é uma causa que abraçamos com o coração.”
A culminância da campanha foi marcada também pela entrega dos prêmios do concurso de redação e desenho, que teve como tema o combate ao abuso sexual. Alunos do ensino fundamental e médio foram homenageados por suas criações que, além de criativas, traziam mensagens poderosas de resistência e alerta.
Lúcia Sara, secretária adjunta de Assistência Social e Cidadania, destacou o impacto dessas atividades no processo de conscientização.

“Alcançamos 28 escolas, tanto na zona urbana quanto na rural. Foram mais de 5.200 pessoas impactadas. E apenas durante a campanha já tivemos cinco denúncias. Isso mostra que estamos no caminho certo.”
Ela reforça que o trabalho não termina com o fim do mês: “A campanha encerra hoje, mas o compromisso com a proteção das nossas crianças continua o ano inteiro. Temos que seguir vigilantes, promovendo prevenção e acolhimento.”
Os dados apresentados pelas autoridades locais revelam uma realidade dura: em 2024, o CREAS já havia registrado 45 atendimentos relacionados a abuso e exploração sexual. E segundo o juiz Luiz Fernando, há uma prevalência alarmante desses crimes em regiões de difícil acesso, onde ainda persiste a ideia equivocada de que a maturidade biológica justifica o início da vida sexual.
“Infelizmente, há um índice muito alto desses delitos, especialmente na zona rural. É assustador. Por isso, a informação é essencial. Precisamos desconstruir essas crenças, fortalecer a rede de proteção e garantir justiça para as vítimas”, conclui.
Um dos focos da campanha foi incentivar o uso do **Disque 100**, canal nacional de denúncias anônimas de violações de direitos humanos. Também foram abordados temas emergentes como a pedofilia virtual e os perigos de jogos on-line, que têm sido porta de entrada para abusadores que se aproveitam da vulnerabilidade de crianças e adolescentes no ambiente digital.
O Maio Laranja em Cruzeiro do Sul chega ao fim, mas deixa sementes plantadas. Sementes de conscientização, denúncia, cuidado e compromisso. Em cada escola visitada, em cada palestra realizada, em cada criança acolhida — a cidade reafirma que proteger a infância é um dever de todos.
“Se uma criança sai de uma palestra e entende que o que vive em casa é errado, e busca ajuda, a campanha já cumpriu seu papel.”* — disse uma das educadoras presentes no encerramento, emocionada.
E o trabalho continua. Porque toda criança tem o direito de ser apenas criança.